Longe de suprir defasagem salarial, proposta do governo para reajustar a remuneração ainda ataca o Estatuto do Magistério Superior

21/12/2021

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Assim como ocorre desde o início do seu mandato, o governo Rui Costa preparou uma perversa surpresa de final de ano. Em mais um artifício ardil e astuto, encaminhou à Assembleia Legislativa da Bahia, na última sexta-feira (17), o Projeto de Lei (PL) N 24.433/2021, que prevê reajuste linear de, apenas, 4% ao conjunto dos servidores para 2022, mais o PL Nº24.425/2021, que estabelece o incremento de parcelas fixas. A votação da proposta na AL-BA deverá acontecer nesta quarta-feira (22), já que em sessão realizada segunda (20), lideranças do governo e da oposição não chegaram a um acordo sobre o aumento da categoria.

 

Distante da melhoria salarial alardeada eleitoralmente à imprensa pelo gestor baiano, os PL tratam-se de um Cavalo de Troia; um engodo destrutivo, aparentemente agradável mas que acarreta consequências terríveisApesar de necessário, o valor é irrisório, sobretudo, quando se leva em consideração o grande período em que não houve ao menos recomposição salarial. O percentual está bem abaixo do ideal para repor a inflação no período entre janeiro de 2015 e dezembro de 2021, que chega a 34%, e as perdas acumuladas nesses sete anos. Em se tratando dos docentes das universidades estaduais, se a referência for janeiro de 2022, a previsão de reajuste salarial é de 50,9%.

A diretoria da Adufs preparou um quadro comparativo dos vencimentos dos docentes que trabalham em regime de Dedicação Exclusiva (DE), 40 horas e 20 horas, considerando o ínfimo reajuste do governo e o reajuste necessário para repor as perdas salariais entre janeiro de 2015 e dezembro de 2021. Segundo o estudo, o professor DE, Auxiliar, nível A, terá um vencimento básico, conforme o PL, de R$ 5.689,92. Se consideradas as perdas salariais dos últimos sete anos, o valor aumentaria para R$ 7.820,57. Veja as tabelas.

 

É importante lembrar que, embora tenha havido reajustes salariais no ano de 2015, os valores repuseram as perdas salariais de 2014 e já incidiram sobre uma base bastante corroída e rebaixada. Isso quer dizer que o suposto esforço em assegurar "ganhos maiores aos servidores com menores remunerações", como o governador tem declarado à imprensa baiana, na verdade, é uma falácia! Todas as classes saem prejudicadas, visto que permanece o arrocho salarial.

 

Reajuste

O reajuste de 4% no salário base será concedido em janeiro de 2022. Servidores da Saúde, Segurança Pública, do grupo técnico administrativo e da Educação terão, também, incremento de parcelas fixas de R$ 100, R$ 200 ou R$300,00 a partir de 1º de abril do próximo ano sobre seus vencimentos básicos.  Os projetos de lei Nº 24.425/2021 e Nº 24.433/2021 fazem parte de um conjunto de PL enviados à AL-BA na última sexta-feira (17), com nova estrutura remuneratória para diversas carreiras do funcionalismo público.

 

A proposta ataca não só a carreira, mas o serviço público baiano. A forma utilizada pelo governo baiano, concedendo reajustes em valores fixos, desestrutura os diversos Planos de Cargos, Carreira e Vencimentos (PCCV). Na verdade, a proposta parece querer dividir a categoria e destruir o sentido da carreira.

Conforme nota do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (Dieese) sobre os reajustes salariais, "é necessário e urgente que os vencimentos mais defasados e, portanto, mais baixos, praticados no estado, sejam corrigidos e reajustados, mas levando-se em conta que as perdas salariais corroeram todos os vencimentos, seria muito mais justo que houvesse um reajuste linear maior para todos. Na verdade, seria desejável também uma atualização ou revisão dos diversos PCCV, a fim de se garantir que as estruturas de carreiras contemplem as mudanças ocorridas ao longo do tempo. Seja com reconfiguração de atividades e, até mesmo, a inclusão de novos cargos. A tendência é que com a distorção que será gerada a partir dos reajustes, os PCCV fiquem deformados". Veja a nota do Dieese. 

Ataque ao Estatuto do Magistério

Além de não atender à pauta de reivindicações dos professores das universidades estaduais, a proposta do governo Rui Costa renova os sistemáticos ataques ao Estatuto do Magistério Público das Universidades do Estado da Bahia e reduz os percentuais dos interstícios entre classes e níveis estabelecidos no capítulo VII deste documento. 

 

Na medida em que reduz esses interstícios, desrespeita o princípio de valorização da titulação, da experiência e de formação continuada. Conforme o Parágrafo Único, Artigo 28 deste capítulo, o interstício entre classes é de 16% da classe de Auxiliar para a de Assistente e da de Assistente para a de Adjunto e de 18% da classe de Adjunto para a de Titular e da de Titular para Pleno. Com o leviano PL do governo, o interstício cai para 15% e 17%, respectivamente.

 

O Plano de Carreiras, Cargos e Vencimentos dos professores das universidades estaduais foi construído considerando um interstício específico, levando-se em consideração os diferentes graus de complexidade entre os cargos, a qualificação requerida para cada um deles e a progressão temporal. "O Plano cumpriu um processo que valorizou a formação docente. O projeto de Rui Costa e sua equipe é um perigo e uma afronta à nossa história, pois abre precedente para o governador fazer o que quiser com o nosso Estatuto, sem consultar a nós, que conhecemos a carreira! O governo agiu de forma leviana, irresponsável e arbitrária. Este foi um ataque frontal. O gestor usa o discurso do reajuste salarial para, de forma sorrateira, atacar este documento, que foi fruto do acúmulo da luta do movimento docente e de greves realizadas nas décadas de 90 e nos anos 2000. Com esta medida, o governo pretende iniciar a desestruturação das diferentes carreiras. O movimento que ele está fazendo é de desvalorização do salário e do professor com mais tempo de serviço. Além disso, a diferença nos vencimentos básicos e a proposta em tramitação na ALBA só reforça a intenção em desestruturar nossa carreira", criticou Gean Santana, diretor da Adufs.

 

Planserv

Ainda no dia 17 de dezembro, o governador encaminhou à AL-BA o PL Nº 24.424/2021. O Projeto reajusta as contribuições dos servidores ao Sistema de Assistência à Saúde dos Servidores Públicos Estaduais - PLANSERV e foi publicado no Diário Oficial do Estado (DOE) no último sábado (17). Além da perda inflacionária acumulada nos últimos sete anos, entre 2015 e 2021, a remuneração dos servidores também sofreu redução por causa dos aumentos do Planserv ocorridos ao longo dos últimos anos. 

 

Outro projeto enviado à Casa Legislativa e aprovado na segunda-feira (20) foi o PL 24.426/2021. O documento propõe a prorrogação dos contratos via Regime Especial de Direito Administrativo (Reda) até dezembro de 2023. A medida reforça a falta de preocupação de Rui Costa e sua equipe com a realização de concursos públicos para a admissão de funcionários no quadro do Estado e com a saúde financeira dos fundos de previdência do estado da Bahia, já que trabalhadores contratados via Reda não contribuem para o Regime Próprio de Previdência Social.

 

"Não somos contrários à contratação via regime Reda, quando necessário para suprir a falta de docente decorrente de afastamentos ou licenças de concessão obrigatória e licença para capacitação, conforme previsto no Estatuto do Magistério Superior. Somos contra a proposta do governo em tentar substituir esse regime de contratação pela admissão via concurso público, como vem ocorrendo nas universidades estaduais", finalizou Gean Santana.

 

Diante de mais um presente de grego do governador, que assim como o presidente Bolsonaro vem intensificando os ataques ao serviço e aos servidores públicos, 2022 deve ser de intensificação das investidas governistas contra a carreira e as universidades estaduais baianas. Um contexto que exigirá ainda mais força e mobilização dos professores. Nessa perspectiva, a categoria mantém-se atenta e mobilizada. O primeiro passo já foi dado logo na última sexta-feira (17), em assembleia. Na ocasião, os professores aprovaram a pauta de reivindicação 2022 indicada pelo Fórum das ADs, que tem como centralidade da luta os salários, direitos, autonomia universitária e financiamento dessas instituições.

 

De acordo com a pauta do Fórum, no ponto Salário, a categoria exigirá a reposição completa das perdas salariais acumuladas nos últimos sete anos por conta da não reposição da inflação neste período. Um dos itens do ponto Direitos é a exigência de o governo não alterar o Estatuto do Magistério.

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