Palestra alerta sobre as dificuldades das pessoas com deficiência

17/04/2018

O desabafo emocionado de Marcílio de Carvalho Vasconcelos, lotado no Departamento de Letras e Artes da Uefs (DLA) há nove anos, chamou a atenção para as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência na Uefs. O docente, que é surdo, comoveu a todos os presentes à palestra sobre “Inclusão em tempos de exclusão e a cultura do capacitismo” com o relato sobre os desafios que enfrenta no dia a dia de trabalho. A atividade foi ministrada pelas professoras Marinalva Oliveira, da Universidade Federal Fluminense (UFF) e ex-diretora do ANDES-SN, e Solange Ribeiro, membro do Núcleo de Acessibilidade desta universidade (NAU).

“Estou muito feliz com a promoção desta palestra, mas, precisamos de ações e de uma comunicação mais efetivas para as pessoas com deficiência. Temos debates na Uefs, que são importantes, porém, depois disso, as ações são muito restritas ou inexistentes. Também é necessária a inclusão linguística. Sinto-me só aqui. Há muito tempo espero melhorias. Até adoeci por enfrentar dificuldades para me comunicar com as pessoas”, relatou Marcílio de Carvalho, reivindicando mais apoio à execução do trabalho na academia.

O debate
Durante a palestra, realizada na última terça-feira (10), Marinalva Oliveira contextualizou historicamente o acesso das pessoas com deficiência à educação no país e afirmou que o sistema educacional, do ensino básico ao ensino superior, é excludente. Também falou que o governo brasileiro tenta atrelar as políticas para as pessoas com deficiência aos interesses do capital, buscando, principalmente depois de 1990, transferir recursos públicos para custear a educação em escolas regulares e especiais ou em instituições filantrópicas.

“Nas décadas de 50 a 80, as pessoas com deficiência não tinham direito de ir às escolas tradicionais. Eram mantidas à margem do convívio social e frequentavam instituições filantrópicas privadas. A lei nº 4.024/61, que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, garantiu a essas pessoas o direito à educação, mas as enquadrou no modelo tradicional. A educação especial sempre foi tratada como apêndice da educação regular, com caráter assistencialista, discriminatório e privatista. Em 2008, foi aprovada a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que estabelece o acesso de todos os alunos ao ensino regular. Proporcionou-se o acesso, mas não a permanência das pessoas com deficiência, que continuam segregadas. A narrativa sobre elas é que são incapazes de produzir, amar e cuidar-se. As pessoas com deficiência chegaram à escola regular, aos ambientes públicos e às universidades, mas esses locais são opressores e meritocráticos. Também não há formação de professores e condições de trabalho adequadas”, enfatizou a palestrante de forma veemente.

Romper estigmas
Ainda segundo a docente da UFF, as opressões às pessoas com deficiência vão além das escolas e permeiam todos os espaços, a exemplo do ambiente de trabalho, locais públicos, meios de comunicação social e a própria família.

Marinalva Oliveira acrescentou que “as dificuldades na vida de um indivíduo com deficiência decorrem do padrão normativo opressor e excludente da sociedade, não da deficiência e da pessoa. Nosso grande desafio é desconstruir a concepção de corponormatividade da estrutura social, é romper com o estigma que acompanha as pessoas com deficiência e superar as muitas barreiras impostas pelo sistema educacional fundamentado sob as bases da sociedade capitalista”. A professora tem afinidade com o assunto não somente por conta da militância, mas por ser mãe de uma criança de 9 anos com Síndrome de Down.

Uefs
Já a professora Solange Ribeiro, em sua fala, informou sobre o documento-base que fundamenta o trabalho do Núcleo de Acessibilidade da Uefs (NAU) e que fora aprovado em 2012 pelo Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) da universidade. No entanto, a docente ressalta que a materialização das ações propostas no documento caminham a passos lentos. Segundo o registro do Núcleo, existem atualmente, na Uefs, 31 pessoas com deficiência.

A vice-reitora Norma Lúcia Fernandes, também presente à palestra, informou que nos dias 15 e 16 de maio a administração da Uefs promoverá um seminário para discutir reserva de vagas para acesso à instituição de grupos historicamente excluídos. Atualmente, ainda conforme a gestora, são contemplados, através da resolução nº 034/2006, os indígenas, negros e estudantes de escolas públicas.

ANDES-SN
Marinalva Oliveira informou que as pessoas com deficiência foram incluídas na lista de estudantes que têm direito à reserva de vagas nas Instituições de Ensino Superior nos termos do Decreto n° 9.034/17. Ao considerar que o Andes-SN tem entre os seus princípios a defesa da universalidade do acesso à educação pública de qualidade, a palestrante reforçou que o Sindicato Nacional indicou que as seções sindicais lutem pela implementação desse decreto.

A palestra “Inclusão em tempos de exclusão e a cultura do capacitismo” foi organizada pelo Grupo de Trabalho de Política Educacional da Adufs (GTPE/Adufs). A diretora da Adufs, Marilene Lopes, também compôs a mesa do evento.  

Leia Também